domingo, 20 de setembro de 2009

mais pra cima

acordei com o ar pesado. e outro teto, ao largo. uma, duas, três, tudo escuro, ainda. um som indefinível no fundo, sei lá se perto ou longe. suor, cheiros, ressaca. ela ainda não acordou. o calor é infernal, não era pra tá, mas tá. olhei umas capas de plástico, de discos, trincadas. de tudo. uns copos de água. empurrei a janela, pra levantar. sono não tinha mais. ela dormindo, discreta, com um quê de modelo meio desbotada, com jeito de quem chora, em branco e rosa, linda. então me deu vontade de caminhar mas, meio grogue, quis ficar por ali. acender um cigarro e olhar pela janela. um vento bom vinha da rua. alto pra burro. centro da cidade. pensei em encostar pra dizer qualquer coisa, mas era pura fagulha de ansiedade, e o vento me varria. era perfeito ficar por ali, tomando a fresca que vinha daquela altura, como se fosse chover. tentar ver e não ver nada, sem óculos, pela janela. as luzes da cidade, de longe, difusas, viradas em estrelas de várias pontas. entre tudo o hipnótico movimento dos poucos pontos de transeuntes pra lá e pra cá, a essa hora. queria andar por ali por baixo como se visto de cima, nessa onda sozinha que não compactua com a monotonia previsível das ondas-pra-lá-e-pra-cá de todos os dias. quis isso tanto quanto quis um chimarrão, uma torrada, ou coisa parecida. quis tanto quanto quis ficar por ali por baixo, ali por cima. lá embaixo uns pequenos pontos apressados circundavam um outro ponto, sem contraste ou nitidez compreendi um bote. dispersaram com a mesma convicção do bote. e esse ponto esteve lá parado, talvez perplexo, num drama qualquer. os outros pontos, no drama, na grana, ou na degradação, espalhavam-se, apressados. o ponto parado dava falta do que viu faltar. sei lá o que. eu dava falta dos óculos e procurei. tava no canto do quarto, encostado no colchão, do lado. sabia que estava ali sem lembrar de nada. nos mesmos cantos ausentes se não tá no rosto. do lado da cama, a qualquer altura ou lugar. meio trincado, coisa boa. daí me senti completo e saciado. pra ser sincero não me esforçava pra lembrar com clareza das coisas que aconteciam, é um bom hábito, a sensação. se tava massa, tava massa. tava calor e abri mais a janela. que vento. me deu vontade de por a cabeça pra fora da janela, curtir aquele vento na cara, olhando mais pra cima e menos pra baixo.

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