segunda-feira, 1 de junho de 2020
Os objetos da infância e os objetos da velhice.
quinta-feira, 14 de maio de 2020
desaguando
quinta-feira, 4 de agosto de 2011
insalubres
em Foucault o ilegalismo da delinqüência é desvelado na minúcia: são tramas necessárias ao poder de esquadrinhá-los, os infames, em redes, organizando o querido e necessário medo do perigo permanente. não são abalos, são engrenagens. a subversão inverte no sistema, o sistema subverte o subversivo nas “casas de correção”: as “casas de passe”, “o inevitável motel”. e não são lapidações, são mastigações. mastigados são devolvidos para o sistema alternativo, integrados no quadro da delinqüência, no desencaixe do jogo maldito dos traficantes, das prostitutas, dos brigadianos, dos pervertidos; abusados. toda mão-de-obra febril convoca medidas de um punho que sufoque o insalubre.
terça-feira, 22 de junho de 2010
baquetas
saquei que tinha acabado de tocar o tambor depois de uns bons minutos, e no hiato que procedeu a pausa parece que a gritaria disforme uniformizou a falta de ritmo de umas heterogêneas percussões, mas eu não pensava em nada disso. sacava na cor do chão, na cor de um por um passando e na alegria que era de não ir pra lugar nenhum, estar na roda, sem tempo, sem prazo, sem talas, sem pressa, sem prender, sem soltar, sem pender. era a festa, era um gol.
quinta-feira, 6 de maio de 2010
outras bandeiras
sonhei que sonhava a esmo, mas preocupado, pelas ruas de Fortaleza. queria ter de tudo, mas meu tempo de brincar tinha ido embora. agora, perdia o fio da segurança entre os papéis de São João. sumido também o fio que me amarrava às ruas dali e às outras, do Maranhão.
quinta-feira, 4 de março de 2010
o Grande e a reprodução interminável
o Grande andava como um torto na muvuca da festa natural, em plena pipoca de um trio elétrico do segundo dia de carnaval soteropolitano. os trios sempre pareceram ligados num fio reprodutor interminável que se estende parindo tendências de novos fios condutores que se prolongam no além-bahia. nesse rumor reproduzido imbricam manifestações tropicando samba-reggaes e axés, que a sociedade, do/no asfalto, espelha gastando o salto. o Grande sabia de cor as formações, as raízes e os cantos de cada uma das coxas que guiavam aquelas marchas. sabia ler isso e via a possibilidade de com outros grandes encabeçar uma redescoberta das mesmas coisas, uma reprodução do reproduzido por outra leitura, algo que refaça uma nova Bahia, e dela, novos Brasis. E em tudo isso não estaria só a viagem da redescoberta, de retorno a um conjunto efetivo de genealogias, mas algo pra produzir uns novos sujeitos, algo a nos [re]produzir, a nós, de novo e de novo.
quarta-feira, 13 de janeiro de 2010
momentos e contextos . “unheimlicheit”
não podemos jamais ir pra casa, voltar à cena primária enquanto momento esquecido de nossos começos de “autenticidade”, pois há sempre algo no meio. não podemos retornar a uma unidade passada, pois só podemos conhecer o passado, a memória, o inconsciente, através de seus efeitos, isto é, quando este é trazido para dentro da linguagem, e de lá embarcamos numa (interminável) viagem. diante da “floresta de signos” (baudelaire), nos encontramos sempre na encruzilhada, com nossas histórias e memórias (as “relíquias secularizadas”, como bejamin, o colecionador, as descreve) ao mesmo tempo em que esquadrinhamos a constelação cheia de tensão que se estende diante de nós, buscando a linguagem, o estilo, que vai dominar o movimento e dar-lhe forma. talvez seja mais uma questão de buscar estar em casa aqui, no único momento e contexto que temos… apuds. Chambers. Hall.
sexta-feira, 18 de dezembro de 2009
além das superfícies
domingo, 20 de setembro de 2009
mais pra cima
acordei com o ar pesado. e outro teto, ao largo. uma, duas, três, tudo escuro, ainda. um som indefinível no fundo, sei lá se perto ou longe. suor, cheiros, ressaca. ela ainda não acordou. o calor é infernal, não era pra tá, mas tá. olhei umas capas de plástico, de discos, trincadas. de tudo. uns copos de água. empurrei a janela, pra levantar. sono não tinha mais. ela dormindo, discreta, com um quê de modelo meio desbotada, com jeito de quem chora, em branco e rosa, linda. então me deu vontade de caminhar mas, meio grogue, quis ficar por ali. acender um cigarro e olhar pela janela. um vento bom vinha da rua. alto pra burro. centro da cidade. pensei em encostar pra dizer qualquer coisa, mas era pura fagulha de ansiedade, e o vento me varria. era perfeito ficar por ali, tomando a fresca que vinha daquela altura, como se fosse chover. tentar ver e não ver nada, sem óculos, pela janela. as luzes da cidade, de longe, difusas, viradas em estrelas de várias pontas. entre tudo o hipnótico movimento dos poucos pontos de transeuntes pra lá e pra cá, a essa hora. queria andar por ali por baixo como se visto de cima, nessa onda sozinha que não compactua com a monotonia previsível das ondas-pra-lá-e-pra-cá de todos os dias. quis isso tanto quanto quis um chimarrão, uma torrada, ou coisa parecida. quis tanto quanto quis ficar por ali por baixo, ali por cima. lá embaixo uns pequenos pontos apressados circundavam um outro ponto, sem contraste ou nitidez compreendi um bote. dispersaram com a mesma convicção do bote. e esse ponto esteve lá parado, talvez perplexo, num drama qualquer. os outros pontos, no drama, na grana, ou na degradação, espalhavam-se, apressados. o ponto parado dava falta do que viu faltar. sei lá o que. eu dava falta dos óculos e procurei. tava no canto do quarto, encostado no colchão, do lado. sabia que estava ali sem lembrar de nada. nos mesmos cantos ausentes se não tá no rosto. do lado da cama, a qualquer altura ou lugar. meio trincado, coisa boa. daí me senti completo e saciado. pra ser sincero não me esforçava pra lembrar com clareza das coisas que aconteciam, é um bom hábito, a sensação. se tava massa, tava massa. tava calor e abri mais a janela. que vento. me deu vontade de por a cabeça pra fora da janela, curtir aquele vento na cara, olhando mais pra cima e menos pra baixo.
domingo, 30 de agosto de 2009
bola oito
uma página e outra, sem política, é o fim. imbricaram os autores. toda trupe que trata do poder indecente da superfície desinteressa, a superfície é impalpável. basta, de ler porcaria tratar de partidarismo com pompa de astronomia. política é o fim. ateus ou fiéis nisso forjam um desprezo agora pela puta que os pariu, mascarando ruptura. a conversão do olhar, viciado. se um rebanho assustado muge em uníssono nessa monotonia volumosa, que derrubou árvores e árvores pra ser realizar, dizendo que de certo modo entendeu a cara magia do funcionamento sutil dos mais modernos rumos da coisa, para profetizar onde cairá, encaçapada, a esfera pública.
terça-feira, 16 de junho de 2009
bandeiras
pra varrer a opacidade do cômodo, da manhã, e do silêncio, num gesto gingado e viciado, achou com o pé o botão vermelho do som, que chiava: ...um menino cresceu entre o afã e a curva, entre a carne e a ficha... subindo em pedreiras ‘quiném’ lagartixa... boréu, juramento, urubu, catacumba, nas rodas de samba, beirando a macumba... o dia clareou, o galo já de longe cantou, é hora... vou ter que trabalhar... não posso mais sonhar... a cama está desfeita mas eu não dormi... não posso mais sonhar... mas só até as dez... só até as dez... e o desatino invejoso do rádio: quem não inveja a infeliz, feliz, no seu mundo de cetim, assim, debochando da dor, do pecado, do tempo perdido, do jogo acabado... bandeiras se desmanchando...
segunda-feira, 8 de junho de 2009
e os vegetais
contava um, quarto, dois, cozinha, três, quatro, e descia. e inalava forte o hálito viciado da garagem, ainda no gosto do café, e, na tontura sonolenta de imaginações espontâneas empurrava a porta e saía, como um gás que se desprende. na frente da casa parava por uns três minutos, compactuando com a mudez de todas as manhãs e dos vegetais. aqui, no translúcido manto de calma sobre o claustro dos quintais.
segunda-feira, 1 de junho de 2009
foto
eu ia bater a foto, mas, de repente, não era eu, não ali, batendo aquela foto. sem mergulhar fundo demais nessa viagem apertava o botão e a máquina indicava qualquer coisa que eu não entendia mais. sem saber onde andava a foto, que eu via, congelada na minha frente, desliguei a máquina. depois rolou o deleite de um ensaio, revelado, que não parecia ser meu.
quinta-feira, 28 de maio de 2009
micromiscelêneas e o resto do disco
os textos são mirrados. e os discos fragmentados em duas dúzias de arquivos, de onde chegam três ou quatro pra arquivos pessoais objetivos e pouco pacienciosos. não faz sentido o que transpõe o instantâneo. os outros por aí fazem coisas lindas contanto que se tenha paciência, contanto que seja breve, porque se houve a vitória de ficar mais que sabendo, se houve a vitória de presenciar alguma coisa, pode ser lá genial. “genial”, disse o paciencioso que presenciou a apresentação inteira. pode-se abreviar o noites do norte, que já é uma abreviação, na lembrança de zumbi. abreviar o cinema transcendental na oração do tempo. tambong e não é céu. e assim mesmo valeu, genial. e ainda tem a continuação, que vira link, todo o resto do disco.
quarta-feira, 27 de maio de 2009
do terceiro ao quinto
mário borba - do terceiro ao quinto
terça-feira, 26 de maio de 2009
contexto
caetano cantava no rádio, a todo volume, e era o que matava o silêncio tão previsto e anunciado. tentamos novas tentativas. tentamos tantas vezes, perdemos tantas vezes. e nos nuances de tantas idas e vindas me via crescendo também, além de mim, ou vivendo, aqui ou ali, mais que antes. e de novo, mais que antes. mesmo sem saber, mas sabendo muito bem o que estava sendo executado no piloto automático pela enésima vez. o carro sabia o caminho de cor. sem remorso ele nos conduzia, anestesiados, digerindo. e eu não pensava no que foi, no que seria, no Transa do caetano, eu pensava no caminho e nas cascas. que já caíam no carro, as que já estariam soltas das paredes do quarto, da sala, de todas as construções reconstruídas tantas e tantas vezes. voava já. quis chegar em casa de uma vez e me ver me espreguiçando no meio de tudo aquilo, daí pensei no óbvio. não estaria eu com vassouras e sacolas pensando nas coisas fora de contexto, eu, que não elejo mais contextos há muito tempo.
sábado, 23 de maio de 2009
disposição
já estava frio o metal da fechadura que ele tateava ansioso por entrar, na casa, a dele, por uns dias. passaram horas que enquanto gelavam o metal marearam o clima do cair da tarde ao quase amanhecer. pensando coisas vagas da topografia da cidade acompanhava absorto o movimento desperto dos pescadores puxando o barco. abriu a porta, cansado, pensando na delícia de um chimarrão. a ausência de erva, cuia e derivados, a disposição minimalista das coisas, a estranheza da porta e a simplicidade do banheiro sustentavam uma sensação esquisita, de, ainda, não estar em casa.
quarta-feira, 13 de maio de 2009
o despertar
era outro, olhando o chão exatamente como ficava, umas marcas a mais na superfície-pó, e o pó na superfície, torpor. desvelado qualquer resquício de rotina: malícia, surpresa e torpor. iscas sinuosas em cordas de rodas, nada muito sério, todo o esplendor em belezas espontâneas, em todo lugar. sem tempo, sem fichas pra cair, e uma consciência que emerge em viagens inconstantes. absorto, adivinha novas pegadas no pó da superfície. e desperta.
segunda-feira, 13 de abril de 2009
do lugar do sujeito
analisando o lugar de fala nos discursos, em livro, em som, no abismo, das esquinas: o lugar do sujeito está em lugares diferentes, móvel, óbvio. um sujeito heterogêneo se auto-ironiza: o sujeito-emissor-propriamente-dito se afirma pela desvalorização do emissor-pessoa-no-mundo: “lanço-me agora em carreira artística, cumprindo um velho projeto”.
segunda-feira, 16 de março de 2009
sobre os gols que não foram novidade
depois de dormir por horas parece que o quarto todo se espreguiça comigo num sono ansioso e preguiçoso que quero terminar, mas não consigo. o sol invade o quarto por todos os cantos e uma nesga chega no rosto. pronto. objetivos preciosos e condenáveis no sonho, coisas que eu tinha que fazer ainda antes de acordar. agora é ligar a TV ou ler o jornal. Lula e Obama dão risadas juntos na capa, a conversa é longa, é o que diz na manchete. Chávez toma portos e aeroportos, sisudo, na foto. Sant´anna alheio a essas bobagens todas comenta o empenho de uma senhora, que lhe falta o nome da memória ainda durante o discurso – Ana... Ana... Eva... - expõe sua irritação com o trânsito e com o plano do Grêmio para o campeonato gaúcho, a idéia de poupar titulares. a ele não agrada, mas respeita. segue, o jornal é sempre igual. as mesmas pessoas, os mesmos processos, as mesmas paradas. os gols, o tempo, a dupla de rapazes que faz sucesso nacional. ontem eu vi os gols, alguém escutou os caras na novela e logo cedo, tapado, senti frio. parece que nada era novidade nem ontem. mesmo nas transmissões mais simultâneas, ouvindo o jogo pelo rádio a alguns segundos da TV, os gols não eram novidade.
domingo, 7 de dezembro de 2008
horas
olhando para o chão, bebendo vinho, vendo os quadrados dos ladrilhos se moverem devagar. a batida do relógio da parede, embalando, distante, a rotineira nostalgia. sem cristais líquidos, sempre a mesma, a hora certa, nos inebriantes tic-tacs e peiiins. ele pode receber todas as palavras novas, mas ninguém mais lembra do que todos diziam quando um relógio foi fixado na parede. as crianças brincando na varanda e o velho constatando que está torto. ninguém mantém vivo na memória como ele, cuidadosamente embalado toda noite, o sorriso no rosto do tio entrando na casa com aquela caixa de madeira envernizada, o pêndulo dourado, tic, a zoeira de sempre, casa cheia, tac, o cheiro da carne da cozinha, tic. tac. na parede. dezenas trabalham na mesma terra de antes, aradores, cavando, sem mensurar quanto vale cada parte disso. dentre os peões: “fogo?”. lá de cima da torre de observação o encarregado acendia um cigarro de palha, e o sol baixando, guardava a vista de mulheres que iam e vinham, descalças. alguns baldes. lá longe um gato cinza grunhiu exatamente depois que o velho relógio, de dentro da casa, badalou as sete horas da tarde.